Oftalmologia de excelência e acessível

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Projeto da Escola Paulista de Medicina com o Instituto da Visão leva alta tecnologia a populações ribeirinhas da Amazônia. Expedição realiza mais de 400 cirurgias gratuitas de catarata.

Por Ana Cappellano | Fotos: divulgação

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Munido de alta tecnologia e acompanhado de uma equipe multinacional de especialistas e pesquisadores, o professor titular de
Oftalmologia da Escola Paulista de Medicina/Hospital São Paulo (UNIFESP) e diretor presidente do Instituto da Visão, em São Paulo, Dr. Rubens Belfort Jr., liderou uma expedição à Amazônia para levar tratamento oftalmológico de ponta à população ribeirinha. De 26 de outubro a 2 de novembro vembro de 2014, o grupo percorreu, a barco, diferentes cidades às margens dos rios Negro e Amazonas realizando cirurgias de catarata gratuitamente com o emprego de equipamentos de última geração e lentes intraoculares.

Esta foi mais uma etapa do “Projeto Catarata do Baixo Amazonas”, que busca comprovar os resultados da aplicação de tecnologias avançadas no tratamento de doenças oculares para que elas se tornem acessíveis a toda a população. “O grande objetivo foi transformar a cegueira da catarata em visão e comprovar que os resultados com a tecnologia mais moderna são muito melhores do que os com as tecnologias antigas”, comenta Dr. Rubens. A técnica empregada durante a expedição, de facoemulsificação da catarata com aparelho Centurion e implante de lentes dobráveis de acrílico, ainda não chegou à maioria dos hospitais e clínicas no Brasil, sendo a Escola Paulista de Medicina/Hospital São Paulo uma das poucas a oferecê-la. Dr. Rubens explica que o diferencial foi o uso do Centurion, considerado o equipamento tecnologicamente mais avançado do mundo.

A decisão de ir à Amazônia veio da constatação de que a quantidade de pacientes com necessidade de cirurgia de catarata no Brasil aumentou nos últimos anos, principalmente nesta área, onde a piora foi brutal e os serviços de atendimento em saúde são precários. Dr. Rubens conta que um dos pacientes operados pela missão se emocionou ao ver uma das netas de quatro anos de idade pela primeira vez. “Ou seja, ele estava cego há quatro anos!”

O professor destaca que as cataratas na região amazônica são bem mais complicadas e difíceis do que as do sul do Brasil, entre outras razões, por serem muito antigas, muito duras — talvez pela grande incidência de luz e raios ultravioletas — e, com frequência, associadas a outras doenças oculares. “São casos de uma complexidade e uma dificuldade muito maiores do que os que a gente encontra, por exemplo, em São Paulo, no Rio e em outras cidades do Brasil. Então, ter uma tecnologia que seja mais moderna e que leve maior segurança é muito importante para se ter os melhores resultados”.

Organização e apoio institucional

O time de profissionais que viajou com Dr. Rubens Belfort Jr. incluindo mais de 25 especialistas,
desde médicos até engenheiros para cuidar dos equipamentos cirúrgicos enfrentou os desafios do atendimento em plena região amazônica com uma boa organização e uma estrutura preparada especialmente para os obstáculos impostos pela natureza do local.

Foram montados verdadeiros consultórios flutuantes nos barcos usados para o transporte da equipe de médicos, com o apoio de renomadas companhias e entidades do segmento de oftalmologia. A Alcon (laboratório norte-americano do grupo Novartis),
forneceu os aparelhos e lentes intraoculares e toda a infraestrutura, e a Fundação Champalimaud, fundação filantrópica portuguesa com atuaçãomarcante em pesquisas oncológicas e oftalmológicas, financiou parte dos gastos da campanha e trouxe cirurgiões de catarata da Índia e de Portugal.

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Do planejamento ao acompanhamento pós-cirúrgico, foi um mês de intenso trabalho que envolveu, ainda, a Fundação Piedade Cohen — FUNDAPI (AM) e o Instituto da Visão, que coordenou tudo.

A equipe cirúrgica ficou alojada nos barcos, onde também ficavam guardados todos os equipamentos, que eram levados a hospitais regionais e municipais para rapidamente serem preparados para as cirurgias. Os pacientes operados foram pré-selecionados por médicos residentes de Manaus, com o intermédio da Fundação Cohen junto ao governo do Amazonas. Depois das cirurgias, uma equipe local ficou responsável pelo acompanhamento pós-operatório.

A maior barreira imposta à expedição foi apresentada pela própria população atendida. “O maior desafio é a população perder o medo. Quando a gente está indo pela segunda ou terceira vez, ela já viu os resultados da operação, então participa com muito
mais frequência. Quando vamos a uma localidade nova, as pessoas não sabem o que vai acontecer”, revela Dr. Rubens.

Resultado para todos

Durante a jornada, foram operadas cerca de 400 pessoas, em cinco cidades. Fez parte das atividades desenvolvidas a distribuição, sem custos, de óculos (fornecidos pela empresa Lupa) nas comunidades atendidas. O sucesso da empreitada deve ter reflexos positivos nas pesquisas sobre as causas da cegueira na Amazônia e trazer mais investimentos em novas tecnologias e estudos no segmento de oftalmologia no Brasil.

Uma das filosofias por trás deste projeto expedicionário é a de que o usuário do sistema público de saúde no Brasil deve ter acesso aos tratamentos mais modernos, adaptando-se as melhores tecnologias à realidade financeira do SUS. “Hoje as pessoas estão vivendo mais e estão precisando de mais ajuda oftalmológica, porque o olho não foi feito para durar 40 anos, muito menos 60. Temos que pensar em como levar à população a tecnologia moderna com custo menor e maior eficiência. Assim, essa pesquisa vai contribuir não só para aqueles pacientes que foram operados, mas para todos os outros no futuro. Pretendemos difundir os resultados e as experiências para que mais pessoas se interessem por esse tipo de trabalho”, afirma Dr. Rubens.

O projeto prepara-se, agora, para chegar a outros destinos carentes de atendimento de excelência em oftalmologia. Pelo menos três novas expedições estão previstas para 2015, entre as quais, uma na região de Coari (AM) e outra na fronteira do Brasil com a Colômbia, no Alto Rio Negro, no município de São Gabriel da Cachoeira (AM).

Oftalmologia requer mais atenção no Brasil

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Para Dr. Rubens, a piora no quadro de cataratas no Brasil está relacionada aos baixos investimentos por parte do Governo. Inúmeros oftalmologistas perderam o subsídio público para realizar atividades cirúrgicas com o encerramento de programas como o antigo “Mutirão da Catarata”. No contexto da cadeia produtiva de saúde, que inclui as redes hospitalares, tanto no setor público quanto no suplementar, a falta de financiamento é o maior problema enfrentado pela oftalmologia. “O financiamento, infelizmente, é pouco. A oftalmologia depende de tecnologia, de escala, e isso dificulta muito. Grande parte dos hospitais não tem serviço oftalmológico adequado porque o financiamento geralmente é ruim”, avalia Dr. Rubens. Ele acredita que a pressão popular, incluindo sobre os convênios privados, que, muitas vezes, oferecem um atendimento de qualidade inferior ao do SUS, é fundamental para a mudança do cenário desfavorável.

 

 

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